Muitos dos meus santos nunca serão canonizados por ninguém e muitos mais já foram canonizados pelo amor, às vezes, proibido.
Afinal, se não é o amor, quem é que santifica?
Muitos santos foram apedrejados por terem amado até o fim.
Estes santos – meus porque eu conheço, e também os desconhecidos, porque os admiro – estão nas ruas, com suas almas nuas, às claras, coerentes com a verdade, mesmo que sua verdade não pareça ser a mais santa oficialmente.
A verdade os santifica.
E como só há uma verdade mesmo, a verdade os canoniza e estes santos pecadores entram na vida antes dos santos que se canonizam a si próprios.
Muitos dos meus santos não são da minha religião, nem da sua, não nasceram aqui, nem falam nossa língua.
Sertão, casa, ladeira, lagoa, lua de todos os santos, santos de todos os cantos, que conhecem nossas dores, sofreram as dores das correntes, nos navios negreiros, nas galés, nas enxadas mal pagas, em hospitais, nas salas de aula, nunca reconhecidas nem remuneradas.
Santos que se ajoelham, que lavam os pés dos seus semelhantes, santos sem esplendores, santos que louvam com violões, nas procissões noturnas da saudade, santos que não conhecem o bronze e o cobre, santos que escutam os corações, corações que batem como tambores.
Santos que rogam por nós bem perto de nós, santos de nossa casa que obram milagres, na paciência conosco, na amizade que, mesmo sem concordar, não nos abandona.
Santos que tiveram filhos, santos cuja virgindade permanece imaculada, nunca intocada por um arranhão de maldade, santos pecadores que, humildemente, reconhecem suas falhas e se esforçam por não serem como, mesmo sem terem escolhido, às vezes, são.
Santos que cruzam as fronteiras e chegam para além do horizonte. Santos das causas humanas, das causas da vida, que são as mais possíveis, desde que se queira.
Santos que preservam a natureza, santos que amam as flores, em bandeiras de todas as cores.
Meus santos, meus amores.
Amém.